A 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo reformou decisão de primeiro grau e anulou uma multa aplicada pelo Detran a um motorista que se recusou a passar pelo teste do bafômetro.
Ao impetrar mandado de segurança, o motorista disse que foi autuado apenas por se recusar a passar pelo bafômetro, e que, sem indicação da autoridade policial de que apresentava sinais de alteração de sua capacidade psicomotora, não poderia ser mantida a penalidade aplicada com fundamento no artigo 165-A do Código de Trânsito Brasileiro. A ocorrência ocorreu na rodovia SP – 055, sentido oeste na cidade de Caraguatatuba, em São Paulo, quando foi abordado por autoridade de trânsito, e, por não se submeter ao teste do bafômetro, foi lavrado o Auto de Infração de Trânsito.
A multa havia sido validada em primeira instância, mas o TJ-SP, por maioria de votos, em julgamento estendido, acolheu o recurso do motorista. O relator do acórdão, desembargador Ricardo Dip, vislumbrou no caso a existência de conflito entre o § 3º do artigo 277 do CTB, e o artigo 186 do CPP.
“Por força do sistema penal, que é unitário, não se pode compungir um condutor de veículo a submeter-se a procedimento de aferição de eventual e atualizada influência de álcool em seu organismo, porquanto isto importaria em admitir a compulsão de produzir prova (fortuitamente) contra o próprio compelido”, afirmou.
Para o relator, o critério in dubio pro reo não somente consagra a exigência de certeza para condenar, mas também corresponde à ideia de que a acusação tem o ônus de provar a culpa: “Ou seja, a certeza suficiente para a condenação, o que se tem entendido como probabilidade confirmatória da culpa quanto a um fato singular e concreto imputado ao réu, é a que guarda correspondência com a prova da imputação, prova que onera quem acusa”.
É neste quadro, em que atua o consequente do status da dúvida, que se deve considerar o papel do silêncio dos arguidos, afirmou Dip. “Poderia até mesmo dizer-se, com uma reserva de provisoriedade, o papel do silêncio dos inocentes ou talvez melhor, dos não ainda convencidamente culpados. Porque é um dado universal a presunção de inocência ou mais adequadamente o status de não culpabilidade”, completou.
Dessa maneira, prosseguiu o desembargador, o non liquet probatório não pode ser superado por meio de uma compulsão de prova produzida pelo próprio imputado, “nem de seu silêncio, é dizer, da recusa lícita de produzir esta prova, extrair-se a confirmação presumida da culpa”.
A conclusão de Dip foi no sentido de que, se o arguido, pelo próprio sistema penal, não é obrigado a produzir prova contra si próprio, conforme o artigo 186 do CPP, não é possível harmonizar tal entendimento com o § 3º do artigo 277 do CTB.
Processo: 1056133-85.2020.8.26.0053.
Fonte: https://dhojeinterior.com.br/tj-sp-anula-multa-a-motorista-que-se-recusou-a-passar-pelo-bafometro/